sexta-feira, 30 de maio de 2008

Imprensa e Internet: Destinos Iguais?

A Imprensa

Quando, no século XV, Johannes Gutenberg imprimiu sua famosa Bíblia, foi criada uma nova era de disseminação do conhecimento e das idéias. Apesar de não poder ser atribuída a ele a concepção de impressão em si, suas invenções e aprimoramento dos tipos, tintas e prensas permitiram que manuscritos com conhecimentos monopolizados pela Igreja Católica se transformassem em livros impressos em massa. A impressão de panfletos faziam circular entre a população da Europa novas idéias políticas, religiosas e sociais. O que antes era passado oralmente, passou a ser divulgado, em grande escala, em papel.

O surgimento da Imprensa mudou radicalmente a História das sociedades. Os ideais da Revolução Americana de 1776 atravessaram o Oceano Atlântico em jornais e folhetos, inspirando os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade da Revolução Francesa. Lenin e Trotsky utilizaram o Pravda para propagarem conceitos socialistas que culminaram com a Revolução Russa.

Da mesma forma como democratizou o conhecimento e a divulgação de idéias através dos livros, a Imprensa também serviu à manipulação das massas implementada por regimes ditatoriais, principalmente por meio de Jornais. O livro impresso tem a característica de ter as idéias ali expressas imunes a alterações por terceiros, e se perenizam ao longo dos tempos, ainda que possam ser combatidas, discutidas ou, eventualmente, revistas. Já os jornais, por serem periódicos, estão sujeitos a mudanças várias, sejam por imposições econômicas, políticas ou sociais.

Passada a euforia inicial com o invento de Gutenberg, a Imprensa começou a gerar descontentamentos em vários setores do Poder. Primeiro foi a Igreja, grande prejudicada pela quebra do monopólio do conhecimento, que passou a condenar autores e livros como hereges. Logo em seguida foram os monarcas - e as monarquias - que se viram ameaçados. Assim surgia a Censura.

Desde o início, a imprensa tradicional foi alvo de censuras e o é até os dias de hoje. Idéias novas (e mesmo antigas) são sempre uma ameaça aos detentores de Poder. A Censura, ou o controle do Conhecimento, pode se manifestar de várias formas, desde as violentas até as dissimuladas. Já tendo controlado praticamente todos os jornais, os nazistas promoveram a "grande queima de livros", quando, no dia 10 de maio de 1933, foram queimadas em praça pública, em várias cidades da Alemanha, as obras de escritores alemães inconvenientes ao regime.

De outro modo, a doutrina capitalista alcançou também a área literária e jornalística, com isso, livros de conhecimento são substituídos pelos de fácil vendagem e "proibidos" à maioria da população por seus altos preços. Da mesma forma, jornais diários repetem incessantemente temas como desastres, mortes, guerras, corrupções, tragédias pessoais e coletivas e todas as demais facetas da miséria humana, intencionalmente ou não, fazendo com que as pessoas se "conformem" com tais acontecimentos como se fossem naturais e inevitáveis, enquanto omitem a maioria das descobertas científicas e idéias contrárias às suas políticas editoriais.

A Internet

Mesmo tendo sua origem em uma rede de computadores militares - a ARPANet - a Internet foi, sem dúvida, um enorme avanço no conceito, na democratização e na tecnologia da Imprensa, ou se preferirem, dos meios de comunicação. Associado a acessibilidade dos PCs, o crescimento exponencial da rede mundial de computadores pode ser considerado como o evento mais marcante dessa virada de milênio.

Primordialmente ocupada por jovens estudantes de tecnologia e adeptos da contracultura - os chamados hackers - a Internet foi rapidamente adotada por pessoas em todo o mundo como uma forma de comunicação e de obtenção de conhecimentos muito mais rápida e eficiente do que rádio-amadores, correios, televisão, livros, jornais, etc.

A Censura

Porém, assim como aconteceu com a Imprensa, já surgem atitudes e idéias de censura na rede. A rápida popularização da Internet não foi acompanhada por igual desenvolvimento da civilização, o que já vem provocando conflitos entre a liberdade de expressão individual e a responsabilidade social. Infelizmente, a mente humana ainda não conseguiu se adaptar à tecnologia. Sendo usada por pessoas de todas as classes sociais e culturais, a Internet passou a desempenhar um papel na civilização muito maior do que aquele para a qual fora concebida e, por ser uma rede mundial, inevitavelmente causou choques culturais diversos. Já são evidentes em Foruns e grupos de discussão as práticas de censura por moderadores e proprietários, os quais criam suas próprias regras segundo suas próprias crenças. Outros modos de censura vêm se disseminando pelo mundo virtual, descaracterizando a Web como uma comunidade aberta. Seguem alguns exemplos:

O mapa ao lado foi elaborado pela OpenNet Initiative e mostra a situação da censura à Internet pelo mundo. O site também aponta várias violações à liberdade de expressão em vários países, em destaque a China. É importante notar que, afora a censura oficial (aquela perpetrada por governos) existem várias outras tentativas de censura conduzidas por corporações que tenham seu interesse econômico ameaçado. Sob alegações de ameaças de terrorismo, pedofilia, direitos autorais, invasão de privacidade e/ou outras de cunho jurídico, econômico ou político, se esconde sempre interesses de manutenção de Poder ou do status quo.

Infelizmente, o mundo virtual não se diferencia muito do mundo real nesta questão. O conceito de censura está dentro de cada ser humano, em maior ou menor grau. Quando moderadores censuram posts em Forums não estão agindo muito diferente de qualquer governo que bloqueie acesso à sites ou blogs, ou a juízes de Direito que obriguem a retirada de comunidades no Orkut, ou ao Pentágono que considera o Google Maps um perigo à segurança nacional norte-americana.

O que é importante destacar é que muitos cidadãos até apóiam a censura em certos casos, desde que não seja ele a ser censurado. Assim como não existe "meio grávida", não existe "meia censura". Ou se condena o preceito de censura em si, ou se estará sempre a mercê de ditaduras diversas, sejam governamentais ou corporativas.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Andaremos de carro, mas morreremos de fome!

Em épocas de histeria em massa, as soluções para os problemas geralmente causam mais e maiores problemas, uma vez que surgem não de análises lógicas e visão de longo prazo, e sim de interesses imediatistas, localizados e, muitas vezes, espúrios.

O alarmismo catastrófico que vem sendo causado pela mídia sobre o aquecimento global colocou os biocombustíveis no patamar de "salvadores do planeta". Os álcoois - principalmente o Etanol - tornou-se a panacéia para os males da queima dos combustíveis derivados do petróleo. Tido como "combustível limpo", o Etanol vem se tornando no derivado agrícola mais disputado pelo mundo globalizado e já se prevê que, em poucos anos, poderá suplantar o petróleo em preço. O mesmo vem ocorrendo com a soja em grão, cujo óleo vem sendo utilizado em misturas com o Diesel.

Como no Projeto SILI procuramos analisar os fatos independente do que é alardeado pela mídia, vamos considerar alguns fatores do uso mundial dos biocombustíveis:

1) A combustão é um processo de oxidação. O Etanol quando oxidado gera Etanal (Aldeído Etílico/Acético) primeiramente e Ácido Acético em oxidação total. Nos motores de automóveis a combustão nunca é total - motivo da liberação do monóxido de carbono - e carros movidos a álcool liberam quantidade significativa de aldeído na atmosfera. O efeito tóxico do aldeído acético é bem conhecido no corpo humano quando ingerido, não havendo, porém, muitas pesquisas quanto à inalação do mesmo. Assim, o poder poluente dos derivados da queima incompleta do Etanol não pode ser ignorado e exige maiores pesquisas. Com certeza, o álcool não é um combustível tão limpo assim;

2) O uso do Etanol como fonte energética pode ser a maior estupidez dos últimos tempos, conforme pesquisa do Prof. Tad Patzek da Universidade de Berkeley. Segundo o geoengenheiro, em termos de combustíveis renováveis, o Etanol obtido do milho é a pior das soluções, pois chega a custar 6 unidades de energia para gerar apenas 1, não havendo grande diferença quando se trata da cana-de-açúcar. Se considerarmos que o processo de obtenção do Etanol passa pela fermentação e subsequente destilação do extrato bruto, além da utilização de máquinas agrícolas, fertilizantes, pesticidas, herbicidas, etc. e juntarmos a isso o baixo valor energético gerado pela queima do álcool, poderemos entender o que quer dizer o pesquisador;

3) A extração de petróleo não ocupa praticamente nenhum espaço em terra. Enquanto um "cavalo-de-pau" - sistema utilizado desde o início da exploração até os dias de hoje - ocupa cerca de 100 m² e é capaz de bombear milhares de barris por ano, a mesma quantidade de Etanol só seria produzida por milhares de hectares de terra agriculturável em 2 safras anuais. Se considerarmos que em alguns países como o Brasil, terras de alta fertilidade, como a terra roxa do interior paulista, estão sendo utilizadas extensivamente com canaviais ao invés de estarem produzindo grãos de valor protéico, perceberemos que a relação custo-benefício é desfavorável aos combustíveis "verdes";

4) Analisando-se dados do IBGE para a safra 2007-2008, nota-se que cerca de 50% da área plantada no Brasil já se destina apenas às cultura de soja e cana. A soja sozinha já ocupa 20,5 milhões de hectares para um total de 57,7 milhões de hectares da safra geral. Isto seria ótimo se a soja, grão de alto valor protéico, fosse consumida largamente no Brasil, porém, por motivos vários (principalmente tradicionais) usamos basicamente o óleo de soja em nossa alimentação diária, o mesmo óleo que agora usam no biodiesel, o que fez os preços dispararem em poucos anos. Afora o óleo, a soja é em sua maioria exportada, sendo um dos 3 produtos de maior valor em nossas exportações atuais, junto com o petróleo (?!) e o ferro. A mesma tabela mostra que, nesse período, enquanto cresceram as áreas plantadas de soja e cana, as áreas de feijão, arroz e trigo diminuiram!

5) Já no início de 2008, no Forum de Davos, especialistas falavam do aumento generalizado do preço dos alimentos afetando principalmente a América Latina e África. O Prof. Homem de Melo da USP considera a atual alta dos alimentos como sem precedentes na História do Capitalismo e que este ciclo de alta será permanente. A FAO - organização da ONU para a alimentação e agricultura - registrou em março de 2008 um aumento de 57% no índice de preços alimentares em relação a março de 2007, atribuindo esse aumento, entre outros fatores, à produção dos biocombustíveis.

Creio que os dados e fatos aqui relatados já são suficientemente preocupantes, apesar de muitos outros existirem, entretanto, ambientalistas fanáticos ainda insistem em defender a produção dos biocombustíveis como se esses não liberassem o mesmo CO2 por eles classificados como o vilão do planeta. Nem mesmo atentam para o fato de que, para o Brasil poder produzir suficiente Etanol para abastecer os EUA, teríamos que devastar boa parte da Amazônia (ou quase toda) para se plantar cana, e isso em um solo sabidamente impróprio para culturas extensivas.

Não estamos aqui defendendo a perenização do petróleo como matriz combustível mundial, até porque as grandes corporações petrolíferas já chegaram à conclusão de que se extrair o ouro negro para simplesmente queimá-lo é um desperdício de uma matéria-prima que poderia ser usada na petroquímica gerando produtos de muito maior valor agregado do que combustíveis em geral. O que alertamos é para os interesses embutidos nos biocombustíveis, seja por corporações ou por países (como o Brasil), sempre unicamente visando muito mais projetos de Poder do que a defesa do meio ambiente.

Como repetimos frequentemente, a saída não está em substitutos paliativos que poderão gerar a fome mundial, mas em pesquisas sérias e sem direcionamento econômico que possam viabilizar a utilização de novas fontes de energia. Já existem alguns avanços significativos em termos de energia fotovoltaica (solar) e nas chamadas "células de hidrogênio" (temas de futuro artigo), mas ainda de forma muito inicial. Infelizmente, a ONU, subsidiária do governo dos EUA, não é capaz de liderar um esforço mundial de pesquisas nesse sentido.

Portanto, leitores, não se ufanem do futuro "promissor" do Brasil como supridor mundial de Etanol, pois corremos o risco de termos os tanques cheios e a barriga vazia!